Poderia o Tribunal na audiência de julgamento conf...

Criado em: 1 de maio de 2025

Respondido usando O3 por Chat01

Pergunta

Poderia o Tribunal na audiência de julgamento confrontar o Arguido com as declarações prestadas por este durante a fase de inquérito? E se tivessem sido prestadas na fase de instrução? E poderia o Tribunal valorar, para efeitos condenatórios, tais declarações prestadas pelo Arguido anteriormente?

Pensamento

Looking into trial procedures

The user asks about the use of a defendant’s statements from the inquiry and instruction phases in a Portuguese criminal trial. In Portuguese law (under the Código de Processo Penal - CPP), statements made during these earlier phases are documented. The court can confront the defendant with these statements, but the value for conviction may depend on certain legal provisions. Articles like 357, 358, and 355 of the CPP could be relevant here for using such statements properly during the trial process.

Reviewing defendant statement use in trial

In Portuguese criminal law (CPP), earlier statements from the defendant can be read in court only under certain conditions, like contradictions or memory loss (Article 356). However, they cannot solely serve for conviction. Both principles of orality and immediacy require the defendant's statements to be reproduced at trial for proper evaluation and discussion. Also, reading earlier statements needs to follow specific legal procedures in Articles 355 and 356 to ensure the right

Thought for 26 seconds

Resposta

Enquadramento legal essencial

TemaNormas principais do CPP (Portugal)
Regra-geral de oralidade e imediaçãoarts. 343.º n.º 1, 355.º
Excepções que admitem a leitura/reprodução de declarações anterioresart. 356.º (todos os n.os, mas sobretudo 1, 3, 7)
Direito do arguido ao silêncio e a não autoincriminaçãoarts. 61.º n.º 1 al. d), 343.º n.º 1
Livre apreciação da provaart. 127.º

1. Confrontar o arguido com declarações feitas no inquérito

  1. É permitido?
    Sim. O tribunal pode confrontar o arguido com aquilo que declarou ao Ministério Público ou à polícia judiciária durante o inquérito. Esse confronto faz-se, em regra, lendo-se trechos do auto de declarações nos termos do art. 356.º n.os 3 e 7 CPP (contradição, refrescar memória ou recusa de depor).
  2. Limites formais
    • Só se lê o estritamente necessário para o confronto;
    • O arguido tem sempre oportunidade de reagir, explicar ou exercer o direito ao silêncio;
    • A leitura fica consignada na acta (art. 363.º).

2. Confrontar o arguido com declarações feitas na instrução

  1. É permitido?
    Também sim. Mesmo que tenham sido prestadas perante um juiz de instrução, as declarações “anteriores” estão sujeitas à mesma disciplina do art. 356.º.
  2. Especificidade
    Como a instrução é já fase jurisdicional, houve contraditório e gravação áudio-vídeo. A reprodução integral da gravação pode ser autorizada (art. 356.º n.º 5), mas continua dependente da exigência de contraditoriedade/necessidade.

3. Podem essas declarações ser valoradas para condenar?

SituaçãoPode servir de prova de culpa?Observações
Arguido repete em julgamento o que disse antes✔️ SimO tribunal aprecia livremente (art. 127.º).
Arguido contradiz-se e o tribunal lê a versão antiga (art. 356.º n.º 3-b))✔️ Sim, mas a declaração prévia só vale depois de debatida em audiência; nunca pode ser valorada isoladamente e em detrimento da nova versão sem fundamentação.
Arguido cala-se em julgamento e o tribunal lê a versão do inquérito/instrução (art. 356.º n.º 7-b))✔️ Pode, desde que: 1) a leitura tenha suporte legal; 2) o arguido tenha sido advertido do direito ao silêncio; 3) existam outros meios de prova que corroborem - a jurisprudência do STJ (p. ex. Ac. de 19-01-2022, proc. 302/18) sublinha que não é legítimo fundar a condenação exclusivamente nessas declarações passadas.
Leitura ilegal ou sem contraditório (violação do art. 356.º)❌ NãoA prova seria nula (arts. 355.º, 125.º).

Resumo-chave:

  • O tribunal pode confrontar o arguido tanto com o que disse no inquérito como na instrução.
  • Para que essas declarações valham como prova, têm de entrar nos autos em audiência pelas vias do art. 356.º e sujeitar-se ao contraditório.
  • Mesmo depois de lidas/reproduzidas, o juiz só pode usá-las para condenar se as fundamentar à luz da livre apreciação da prova, sem violar o princípio nemo tenetur se ipsum accusare nem fazer delas a única base da decisão.

4. Jurisprudência ilustrativa

  • STJ, Ac. 14-07-2021, Proc. 274/18.0JELSB.S1 – reforça que a leitura de declarações do inquérito é legítima quando o arguido “invoca o direito ao silêncio”, mas a valoração exige fundamentação acrescida.
  • STJ, Ac. 18-10-2023, Proc. 602/19.4T9VNG.P1.S1 – relembra que a gravação integral do interrogatório judicial pode ser reproduzida em julgamento (art. 356.º n.º 5), mas não dispensa contraditório efectivo.

Em síntese: sim ao confronto; sim à leitura nas condições legais; sim à valoração, mas nunca como prova automática ou isolada.

Compartilhar esta Q&A